Alnitak II
As duas luas gêmeas quase tocavam a linha reta do horizonte, a maior seguindo a menor, e bem no meio, no zênite, daquele imenso céu amarelado já dominava o incrível sol deles, azulado, azul-piscina. Perguntei novamente para o que me acompanhava, meu espécie-de-guia, o nome do planeta. Nome muito estranho, não consigo lembrar. Mas êle repetiu para mim os dois nomes do sol, o nome dado por êles e o nome dado por nós: Alnitak. Esse eu conhecia muito bem. Aliás, foi o único nome que reconheci durante toda essa viagem. Estávamos num gigantesco planalto sem fim, numa cidade muito bonita e agradável, moderníssima, de arquitetura predial e traçado urbano bastante arrojados, suspeitamente parecida com a capital brasileira, Brasília – diferindo desta apenas pelos imensos e densos bosques e florestas, que a cercavam por todos os lados. Quase nenhuma circulação de gente e veículos nas grandes vias terrestres que, com suas áreas verdes, espelhos dágua e estranhos pátios, pistas e praças, deveriam servir mesmo era como áreas de lazer e práticas esportivas. O movimento maior estava nos céus, apinhado daqueles pequenos veículos aéreos, parecendo microônibus, deslocando-se silenciosa e ordenadamente de um prédio para outro e para outros locais fora da cidade – provavelmente para outras cidades.
Num de nossos freqüentes encontros entre visitantes e nativos, que eram assim como um tipo de reunião-palestra-curso, fiquei conhecendo um pouco mais, ou o suficiente, a respeito de certos assuntos sobre os quais guardava imensa curiosidade: as estruturas e as instituições sociais, políticas, econômicas, religiosas e espirituais daquele povo. Quanto ao social-político-econômico, o espécie-de-chefe do meu espécie-de-guia esclareceu que ao longo de sua tri-cento-milenar história eles haviam experimentado de tudo: impérios, teocracias, ditaduras, monarquias, reinos, anarquias, sacro-impérios, repúblicas, parlamentarismos, oligarquias, democracias, etc, em todos os matizes e variantes possíveis, socialistas, capitalistas, comunistas, absolutistas, relativistas, etc, que estas entidades organizacionais pudessem proporcionar. Nada deu certo, muito pelo contrario. Somente nos últimos cinco mil anos, em que o planeta está, enfim, unificado e pacificado como uma única nação, sob um único governo global, é que as coisas começaram a dar certo. O sistema atual é algo parecido como uma democracia-social-liberal parlamentarista, meio capitalista, meio comunista, com liberdade individual total, isto é, ninguém é obrigado ou coagido há viver sob o establishment. Por exemplo, um anarquista, um racista, ou um fundamentalista religioso, pode perfeitamente procurar, ou até fundar, um feudo, um grupo, um partido, que corresponda às suas aspirações político-sociais; e se porventura um dia estes constituírem força suficiente para desbancar o regime posto, então, nesse dia, e somente nesse dia, se verá o que fazer.
Quanto ao que chamamos de instituições religiosas, nada. Quanto ao que chamamos de instituições espirituais, tudo. Já tiveram seus Cristos, seus Budas, seus Maomés, seus Moisés, e nenhuma instituição ou estrutura religiosa derivada, ou fundada, em nome destes, deu certo ou foi produtiva. Apenas os aspectos, preceitos, ou fundamentos estritamente filosóficos e espirituais destas entidades sobreviveram e foram positivamente produtivos para a vida política, social e econômica, individual ou coletiva, das pessoas. Porém, da mesma forma que ocorre no sistema político-sócio-econômico, a liberdade de culto e expressão religiosos é plena e é direito garantido a quem quer que seja, individual ou coletivamente.
Certo dia fomos visitar os dois satélites naturais, as duas luas gêmeas, muito parecidas com a nossa, que estavam quase em uma singular conjunção cósmica. De volta ao planeta, pudemos observar um fantástico eclipse lunar parcial, de uma lua sobre outra.
Mas, a grande surpresa, o ponto culminante, a revelação maior, o fato mais importante, de toda essa jornada, ficou para o final, quando eu já estava retornando, ou sendo devolvido, para casa. Pois foi só então que ganhei coragem suficiente e resolvi perguntar ao meu espécie-de-guia – talvez um dia lembre seu impronunciável nome – o que eles conheciam e, principalmente, quais eram seus interesses a respeito da minha Terra. E êle me revelou a surpreendente e estonteante história, que resumidamente é a seguinte: Há cerca de 30.000 anos (deles) atrás, ou 15.000 dos nossos, quando eles iniciaram as suas explorações espaciais de longo alcance, de um sistema estelar para outro, com naves de grande porte (mais de 20 tripulantes), decidiram, obviamente, começar pelos sistemas mais próximos, entre os quais este cuja estrela-mãe chamamos de Sol. Aqui chegando, descobriram com grande entusiasmo e satisfação que o terceiro planeta desse sistema, que denominamos Terra, era incrivelmente parecido com o seu planeta de origem. E possuía todas as condições básicas e necessárias para o estabelecimento de vida inteligente; perfeito para seres como eles – o nível da força de gravidade, a fertilidade do solo, a composição atmosférica e, principalmente, a grande abundancia de água, foram os fatores determinantes; aliás, o nome que eles deram para a Terra, traduzido para nós, é justamente este: Água.
Como a vida animal encontrava-se num estágio muito primitivo, incipiente, e ainda não se distinguia por aqui nenhum ser inteligente que pudesse se tornar dominante – os macacos de maior porte, apesar de serem de espécie similar à deles, levariam ainda alguns milhões de anos para conseguir – eles resolveram fundar aqui a sua primeira colônia interestelar em larga escala (interplanetárias, em pequena escala, já tinham cinco colônias, utilizadas basicamente para pesquisas cientificas e exploração mineral, localizadas no próprio sistema de Alnitak). Praticamente toda a tripulação, cerca de 60 pessoas, metade homens, metade mulheres, se candidatou a colono, e foi instalada aqui com todo o conhecimento cientifico e capacidade tecnológica suficientes para desenvolver uma grande civilização. Perguntei, então, qual era o motivo das visitas, do retorno, deles à Terra (ou Água). Resposta: a atual situação política, social, econômica e ambiental da colônia não andava nada bem, caminhavam rapidamente rumo à autodestruição, o que não era nada bom. Precisavam observar, investigar as causas; sentiam-se na obrigação, no dever, de tentar corrigir, de procurar ajudar; talvez até intervir diretamente, o que seria uma ação extremamente não recomendável e perigosa.
Muito atordoado e desconfiado solicitei ao meu espécie-de-guia, de um modo um tanto audacioso e desafiador, provas concretas e irrefutáveis de toda aquela história maluca que êle contava, ao que, paciente como sempre e quase ironicamente, êle logo atendeu. Informou-me que “provas concretas e irrefutáveis” poderíamos facilmente obter quando resolvêssemos explorar, investigar e decifrar, seriamente, à luz dos nossos ancestrais conhecimentos filosóficos e espirituais (mas nunca “religiosamente”, ou por simples fé), o que está “escrito”, por “dentro” e por “fora”, nas pedras dos mais antigos monumentos arquitetônicos do planeta – citou, especial e enigmaticamente, os conjuntos das pirâmides de Gizé, no Egito, e de Teotihuacan, no México. Dito isso, apontou para uma grande tela que fez surgir à nossa frente, na qual apareceram três desenhos, ou fotos espaciais, lado a lado: a formação das três pirâmides de Gizé, a formação das três pirâmides de Teotihuacan e a formação das três estrelas do que chamamos de Cinturão de Órion (as nossas tão conhecidas Alnitak, Alnilam e Mintaka).
Então foi a vez dele perguntar, depois de me pedir para observar e analisar atentamente as disposições nas três figuras – absolutamente semelhantes entre si com relação aos tamanhos, proporções, posições, alinhamentos e inclinações relativas dos seus três objetos –, se eu achava que aquilo era mero acaso ou coincidência.
Robert Silvercore
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