Alguém irremediavelmente viciado em escritas e estrelas, projetando palavras interiores em espaços exteriores.
sábado, 1 de agosto de 2015
Policromogastroaromasensofonia
Policromogastroaromasensofonia
Enquanto caminhava calmamente por aquela magnífica floresta tropical, ela ouvia uma maravilhosa sinfonia de cores, como uma imensa e fabulosa orquestra caleidoscópica produzindo, emitindo, ressonando e reverberando harmoniosa e compassadamente a vibração de todos os matizes, nuanças e tons de todas as cores de cada planta, cada flor, cada ramo, cada galho, cada tronco e até de cada raiz, por mais profunda, escondida e obscura que estivesse.
Ao mesmo tempo ia vendo de forma nítida, clara, pura e cristalina, todos os sons, barulhos, uivos, piados, trinados, tritrilados, zumbidos, grunhidos, cantos, gritos, crocitos, coaxados, roncos, choros, lamúrias, alardes, alarmes, cacarejos, arquejos, sussurros e cochichos de todos os bichos, fossem eles andantes, parados, rastejantes, grudados, voadores ou trepadores, da floresta.
Podia, ainda, sentir à flor da própria pele todos os aromas, todos os cheiros, todos os odores de todas as plantas, árvores, ramos, matos, capins e flores; enquanto degustava, saboreava, e às vezes até comia, todas as sensações epidérmicas, físicas e ortopédicas que ia sentindo: um toque, um esbarrão, um tropeço, uma carícia, um arreio, algo seguro na própria mão, uma outra mão, o simples caminhar, o correr, o ficar, o frio ou o calor que sentia e até mesmo o próprio espaço que a envolvia.
Só não entendia muito bem como é que conseguia, simultaneamente, cheirar todo calor, frio, umidade, secura, vento, sol ou lua que fazia, tanto de noite quanto de dia, mas... tudo bem, acostumou-se com isso também.
Tornou-se um saudável, regenerativo, agradável e instrutivo hábito diário, matinal, florestal e floral: todo meio de ano, nos meados de julho, lá ia ela pra sua floresta de ipês roxos, amarelos, brancos, rosas, vermelhos, azuis, lilases, cremes, laranjas, mexericas, abacates, mamões, melancias, melões, manacás, jabuticabas, jatobás, sibipirunas, aroeiras, paraúnas e mangueiras.
Porém, bem mais tarde na vida, um dia consultando sua médica geriatra-geneticista, descobriu que em sua montagem genético-cromossômica – aquela onde ocorrem as manipulações via DesoxyriboNucleic Acid (o tal DNA), para definição de características secundárias, tais como: cor dos olhos, dos cabelos, da pele, etc – todos os pares de conectores terminais dos seus feixes de nervos acopladores que interligam os neurônios senso-especialistas do seu multiprocessador central (cérebro) aos seus respectivos dispositivos sensores-captadores periféricos básicos (boca, olhos, nariz, ouvidos e pele) haviam sido todos imprudente, espantosa e premeditadamente trocados, invertidos, permutados, assim: 1a com 3b, 2a com 1b, 3a com 4b, 4a com 5b, 5a com 2b.
Depois dessa desnecessária, dispensável, infeliz e trágica consulta médica, ela desenvolveu irremediavelmente uma nova doença psicótica, jamais antes observada, que pode ser classificada e catalogada como sendo uma espécie de síndrome de multifonocromogastroaromasensofobia.
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