Alguém irremediavelmente viciado em escritas e estrelas, projetando palavras interiores em espaços exteriores.
sexta-feira, 9 de setembro de 2016
Paredes Caídas, Paredes Erguidas
Paredes Caídas, Paredes Erguidas
Foi lá no quartinho dos fundos, muito além, rumo norte – onde me nortei ou me desnortei de vez –, além de todos os grandes quartos, salas, corredores, varandas e halls, entre paredes que testemunharam quase 20 anos de Rock’n’Roll. Quase 40 anos depois, volto à casa onde nasci, cresci e vivi por exatos 25 anos, e da qual só sai depois que casei. Casa que o meu pai vendeu logo depois que eu me mudei.
Foi lá no dia dos 100 anos do nascimento dele, do meu pai, depois da missa na igreja já quase secular quase ao lado da casa também já quase centenária onde eu nasci. A nova dona da casa chamou a gente pra visitar a velha casa agora nova – se não estivéssemos dentro de uma igreja católica, eu diria que foi quase um histérico pandemônio familiar.
Era um casão, a casa velha: 5 quartos, 3 salas, 3 banhos, 1 cozinhão, 1 alpendre e 1varandão, 1 quintal, 13 irmãos, pai e mãe, 3 ou 4 empregadas, população flutuante indefinida e constante, e 1 barracão (com mais 3 quartos, 1 banho, fogão a lenha e um grande, imenso, tanque de lavar roupas – pra roupa de 15 a 20 pessoas, haja tanque!
No quintal? figueiras, limoeiros e laranjeiras, gangorras (balanços pras crianças) sob a parreira das videiras, um galinheiro, um coelhal e um pombal. Um quintal todo trançado de arames de varal. Com tanta gente, onde quarar tanta roupa, afinal? Haja varal!
Na frente da Rua Silva Jardim, um belo jardim com roseiras, manacás e roseiras, e damas da noite e do dia, e outras plantinhas dia e noite perfumeiras. Garagem pra 3 ou 4 carros, em época que cada casa tinha apenas um – um carro pra carregar 15 ou 20 pessoas? Kombi! (freqüentemente duas)
Na frente do jardim, um murinho baixinho, de pouco menos que um metro, de frente pra rua e pra cidade felizes e amigas. Muro depois erguido, elevado, pra mais de dois metros de altura quando, de repente, não se sabe bem quando nem porquê, a rua e a cidade se tornaram tristes e inimigas.
Casa antes já tão velha e agora tão nova. Reformada, reformulada, reconstruída, refuncionalizada. O quarto de dormir, estar, viver, ler, ouvir sonhar e acordar virou sala de jogos de jogar. No lugar da cama, uma mesa de bilhar. Mas, como então, continua local de pura diversão.
Paredes caíram, paredes subiram.
Mas, lá onde era aquele quartinho dos fundos, onde eu e o meu rock'n'roll nos exilamos voluntariamente há mais de 50 anos, na mesma irremovível parede do fundo, onde pendurei uns velhos pôsteres dos Beatles e dos Pink Floyds, agora encontrei pendurados novos pôsteres dos mesmos Beatles e Pink Floyds.
Pois é, as paredes caíram, mas os pôsteres ficaram. Permaneceram como, talvez, as únicas coisas que concretamente ligam, conectam, as duas casas. Paredes que, ao invés de mural pintado, riscado e cheio de cartazes, mapas, pôsteres e papeis colados ou pregados, agora sustenta e ostenta simples tijolinhos envernizados.
Paredes testemunhas e cúmplices concretas de 15 felizes e fantásticos anos (1962-1977) de Beatles, Pink Floyd, Genesis, Aldous Huxley, George Orwell, Chico, Caetano, Gil, Mutantes, Raul Seixas, Jorge Amado, João Cabral, Betânia, Elis, Gal, Isaac Azimov, Dostoievski, Hermann Hesse, Led Zeppelin, Bob Dylan, Vinicius, Jobim, Lenine, Tom Zé, Zé Ramalho, Carlos Drummond, Fernando Pessoa, Garcia Marquez, Pablo Neruda, Chopin, Mozart, Beethoven, Pink Floyd e Beatles, no quartinho dos fundos.
Mapas by Brumbe: planta-baixa da casa velha, depois da última reforma feita pelo papai.
Foto by Ana Corrêa: Brumbe postado na parede posterizada do quartinho dos fundos.
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