quinta-feira, 29 de setembro de 2016

vezes


Às vezes a gente...

Às vezes as vezes se vão
As vezes às vezes se perdem
Às vezes, sim
Outras vezes, não
Às vezes a gente não pensa direito antes de falar
As vezes que a gente não falou pode ser porque pensou direito antes de falar
As vezes às vezes não se repetem pra gente poder corrigir o que às vezes as vezes podem permitir
Sem falar que certos agentes às vezes impedem as vezes da gente
Ou das vezes que certa gente às vezes é agente do cerceamento da gente
E quantas vezes a gente já tentou multiplicar zero vezes infinito?
Deu certo? Às vezes
(resultado muito bonito!)
As vezes às vezes se perdem
Às vezes as vezes se vão
Umas vezes, sim
Às vezes, não
Outras vezes?
Talvez, às vezes,
Com outras vozes

by Brumbe (c) 2016,
às vezes, sem outras vezes
com outras vezes, às vezes

sexta-feira, 23 de setembro de 2016

outra prima (versão II)


outra prima (versão II)

tá chegando, enfim, a primavera
com seus longos e belos cabelos,
todos bem floridos e presos à cabeça.
e que sejam todos deveras
livres, leves, sedosos e soltos,
mesmo não sendo os da prima vera.
mesmos cachos e mechas revoltos,
mas, de uma outra prima que seja.
talvez uma que eu nem mais reconheça,
já longínqua e perdida em remotas eras.
ou outra cuja estação venha e permaneça,
uma bela e graciosa prima dos outros.

terça-feira, 20 de setembro de 2016

do fio à fibra


do fio à fibra

Ivan Gagarin, o pai, viu uma lâmpada elétrica pela primeira vez em 1931, lá nos cafundós das estepes da Rússia.
Iuri Gagarin, o filho, foi o primeiro ser humano a subir ao espaço, num vôo orbital, em 1961, lá no deserto do Cazaquistão.
Li esta pequena historinha há algumas décadas e isto me deixou profundamente impressionado.
Imaginem só: um humilde carpinteiro russo conheceu a luz elétrica em 1931, e o seu próprio filho pilotou uma nave espacial, a primeira engenhoca cósmica tripulada (Vostok 1 (*)), apenas 30 anos depois!
(*) Estas primeiras cápsulas espaciais – tantos as americanas (Mercury) quanto as soviéticas (Vostok) –, para apenas um tripulante, eram tão pequenas e apertadas que os engenheiros diziam que os astronautas, ou cosmonautas, não entravam nelas, eles as “vestiam”.
Voltando ao vestido em pauta: Esta disparidade, este contraste, temporal entre a luz elétrica e a nave espacial, sempre representou para mim um fato altamente emblemático, marcante, simbólico, da incrível, fantástica e vertiginosa evolução científica e tecnológica que a humanidade experimentou nos últimos cem anos (1910-2010).
E posso dizer que comigo aconteceu algo bem parecido, tecnologicamente falando, ao que aconteceu com a família Gagarin – mas, claro, guardada as devidas e infinitas proporções entre a importância dos fatos e dos personagens envolvidos –, com a diferença que não foram fatos ocorridos com meu pai e comigo ou comigo e uma filha minha. Não, foram fatos ocorridos comigo mesmo num período ainda menor, em cerca de dez anos – mas todos no nível do solo, da terra, ou no máximo a três metros de profundidade ou oito metros de altura, nada a nível estratosférico, espacial ou cósmico.
Por volta de 1975, eu percorri a pé uma estradinha de terra no norte de BH para mapear e projetar um único circuito de fios de cobre, através de postes e cruzetas de madeira, saindo de um cabo telefônico na esquina de Pedro I com Pe. Pedro Pinto, para instalar um único telefone fixo num sitiozinho lá pros lados do antigo hipódromo Serra Verde, próximo de onde é hoje a Cidade Administrativa do Estado – e era muito comum eu fazer este tipo de serviço naquela época.
Em abril de 1985, eu participei do planejamento e projeto para instalação do primeiro cabo de fibras ópticas do Brasil – um projeto nacional, com instalações simultâneas nos maiores Estados –, um simples cabinho subterrâneo com 6 fibras ópticas, em que cada fibra (com pouco mais que a espessura de um fio de cabelo) era capaz de transmitir, num feixe de laser multímodo, a exorbitância inacreditável de 480 comunicações telefônicas simultaneamente!
E este cabo foi instalado interligando o centro de BH e a região da Pampulha, até uma estação telefônica próxima daquela estradinha onde dez anos antes eu projetava circuitos de fios de cobres de 2,5 mm pra instalar um único telefone!
Pois é, o Gagarin Pai não inventou a lâmpada elétrica e só viu tal luz, pela primeira vez na vida, já adulto. Eu também não inventei nada de fios telecomunicadores e só os conheci já menino na vida.
E o Gagarin Filho também jamais inventou ou construiu um bólido espacial, mas foi o primeiro homem a se encapsular e voar num deles. Eu também jamais tive coisa alguma a ver com a criação da fibra óptica para fins de telecomunicações, mas ajudei a instalar as primeiras do Brasil.
E hoje, em 2016, quando passo de carro a 110 km/h, semanalmente, por onde era aquela mesma estradinha de terra – hoje é uma grande via expressa de pistas de concreto e asfalto –, me pego freqüentemente pensando:
Em 40 anos: de um fio de cobre, passando por uma fibra óptica, e, agora, este celular no bolso, que, aliás, faz muito mais do que só falar: traz o mundo inteiro, em texto e imagens, nesta telinha!
E fico pensando como é que vai ser daqui a 10, 20 ou 30 anos, quando eu passar, talvez voando, levitando ou me teletransportando, por aquela mesma estradinha.

Foto: Diagrama de parte da rede de cabos opticos da área central de BH em 1995, projetada e desenhada por Roberto (Brumbe) Correa e equipe, para Telemig/Telebras

sexta-feira, 9 de setembro de 2016

Paredes Caídas, Paredes Erguidas


Paredes Caídas, Paredes Erguidas

Foi lá no quartinho dos fundos, muito além, rumo norte – onde me nortei ou me desnortei de vez –, além de todos os grandes quartos, salas, corredores, varandas e halls, entre paredes que testemunharam quase 20 anos de Rock’n’Roll. Quase 40 anos depois, volto à casa onde nasci, cresci e vivi por exatos 25 anos, e da qual só sai depois que casei. Casa que o meu pai vendeu logo depois que eu me mudei.
Foi lá no dia dos 100 anos do nascimento dele, do meu pai, depois da missa na igreja já quase secular quase ao lado da casa também já quase centenária onde eu nasci. A nova dona da casa chamou a gente pra visitar a velha casa agora nova – se não estivéssemos dentro de uma igreja católica, eu diria que foi quase um histérico pandemônio familiar.
Era um casão, a casa velha: 5 quartos, 3 salas, 3 banhos, 1 cozinhão, 1 alpendre e 1varandão, 1 quintal, 13 irmãos, pai e mãe, 3 ou 4 empregadas, população flutuante indefinida e constante, e 1 barracão (com mais 3 quartos, 1 banho, fogão a lenha e um grande, imenso, tanque de lavar roupas – pra roupa de 15 a 20 pessoas, haja tanque!
No quintal? figueiras, limoeiros e laranjeiras, gangorras (balanços pras crianças) sob a parreira das videiras, um galinheiro, um coelhal e um pombal. Um quintal todo trançado de arames de varal. Com tanta gente, onde quarar tanta roupa, afinal? Haja varal!
Na frente da Rua Silva Jardim, um belo jardim com roseiras, manacás e roseiras, e damas da noite e do dia, e outras plantinhas dia e noite perfumeiras. Garagem pra 3 ou 4 carros, em época que cada casa tinha apenas um – um carro pra carregar 15 ou 20 pessoas? Kombi! (freqüentemente duas)
Na frente do jardim, um murinho baixinho, de pouco menos que um metro, de frente pra rua e pra cidade felizes e amigas. Muro depois erguido, elevado, pra mais de dois metros de altura quando, de repente, não se sabe bem quando nem porquê, a rua e a cidade se tornaram tristes e inimigas.
Casa antes já tão velha e agora tão nova. Reformada, reformulada, reconstruída, refuncionalizada. O quarto de dormir, estar, viver, ler, ouvir sonhar e acordar virou sala de jogos de jogar. No lugar da cama, uma mesa de bilhar. Mas, como então, continua local de pura diversão.
Paredes caíram, paredes subiram.
Mas, lá onde era aquele quartinho dos fundos, onde eu e o meu rock'n'roll nos exilamos voluntariamente há mais de 50 anos, na mesma irremovível parede do fundo, onde pendurei uns velhos pôsteres dos Beatles e dos Pink Floyds, agora encontrei pendurados novos pôsteres dos mesmos Beatles e Pink Floyds.
Pois é, as paredes caíram, mas os pôsteres ficaram. Permaneceram como, talvez, as únicas coisas que concretamente ligam, conectam, as duas casas. Paredes que, ao invés de mural pintado, riscado e cheio de cartazes, mapas, pôsteres e papeis colados ou pregados, agora sustenta e ostenta simples tijolinhos envernizados.
Paredes testemunhas e cúmplices concretas de 15 felizes e fantásticos anos (1962-1977) de Beatles, Pink Floyd, Genesis, Aldous Huxley, George Orwell, Chico, Caetano, Gil, Mutantes, Raul Seixas, Jorge Amado, João Cabral, Betânia, Elis, Gal, Isaac Azimov, Dostoievski, Hermann Hesse, Led Zeppelin, Bob Dylan, Vinicius, Jobim, Lenine, Tom Zé, Zé Ramalho, Carlos Drummond, Fernando Pessoa, Garcia Marquez, Pablo Neruda, Chopin, Mozart, Beethoven, Pink Floyd e Beatles, no quartinho dos fundos.

Mapas by Brumbe: planta-baixa da casa velha, depois da última reforma feita pelo papai.
Foto by Ana Corrêa: Brumbe postado na parede posterizada do quartinho dos fundos.

quinta-feira, 1 de setembro de 2016

a conta de quem lê


a conta de quem lê

aaahhhh,
por isso gosto tanto de escrever:
a interpretação, boa ou má,
tanto faz como tanto fez,
é da conta de quem lê.
e a minha não conto,
pois não conta
e não há que conhecer
e nem é necessário saber
se bem ou mal se vê.

by Brumbe (c) em 2016
ou em outro ano, talvez