quanto mais velhos ficamos,
menos tempos temos.
Alguém irremediavelmente viciado em escritas e estrelas, projetando palavras interiores em espaços exteriores.
Estes lindos panoramas marítimos que as minhas belas janelas nordestinas, de João Pessoa e de Recife, têm me proporcionado, me fazem lembrar aquela tão simples, profunda e famosa estória que o Eduardo Galeano, grande escritor uruguaio, gosta muito de contar.
É a do pai que leva o filho, ainda criança, para ver o mar pela primeira vez, e o menino, ao se deparar com toda aquela magnífica imensidão oceânica, fica tão maravilhado e estupefato que só consegue falar:
- Pai, me ajuda a olhar!
Pois eu estou aqui hoje que nem aquele menino: precisando urgentemente de alguém que me ajude a olhar para todo esse mar! Ele é muito para mim só, preciso dividir, compartilhar, isso com alguém.
Tambaú
O primeiro livro de Geografia do Brasil que eu tive, aos 7 ou 8 anos de idade, na escola primária, apresentava, destacadamente, as Regiões, os Estados e as capitais estaduais do Brasil.
Havia fotos de atrações ou pontos de referência de cada uma das cidades: o Pão de Açúcar, no Rio, o prédio do Banespa, em SP, a igrejinha da Pampulha, em BH, o elevador Lacerda, em Salvador...
E, de João Pessoa, havia, para mim a sempre fantasiosa, enigmática e misteriosa, foto aérea do hotel Tambaú.
Não tinha outro jeito nem escapatória, toda vez que abria o livro eu sempre me deparava com ela: aquela imensa roda, aquele prédio circular em forma de uma roda completa, plantado à beira-mar, me desafiando e instigando a minha imaginação (parecia mais era uma nave espacial, um disco voador, pousado em terra).
E, hoje, 60 anos depois, eu fui, enfim, caminhar na praia do Tambaú, que fica aqui pertinho, logo ao sul da Manaíra.
E passei, pela praia, bem ao lado do misterioso e majestoso prédio, na pequena faixa de areia entre as suas grandes colunas cônicas de concreto e as ondas do mar, que nelas batem nas marés cheias.
Na verdade, eu já tinha passado por ali dias antes, rapidinho. Mas, hoje, como bom mineiro, passei mais devagar, devagarinho, sem ligeireza, na calma, na moleza, de modo a poder bem apreciar a coisa, o trem.
(o hotel tá fechado e meio abandonado, quase em ruínas. mas, dizem que vai ser restaurado e reaberto brevemente. tomara que sim!)
Lembrei, e deu saudade, do meu primeiro livro de Geografia do Brasil.
(fotos obtidas no facebook)
(projeto do arquiteto Sérgio Bernardes)
some inner lights
from my house at night
just before the moon
spreading her gloom
(algumas luzes internas
da minha casa à noite
pouco antes da lua
espalhar sua melancolia)
"hoje não há lembranças"
(o facebook avisou)
um dia sem lembrança!
ai de mim!
sem lembrança de um só dia
sem lembranças
ai de mim!
que só vivo de lembranças...
A gente já se acostumou tanto a pagar ($$$) por tudo nesse mundo que tá rolando aí a bola, quadrada, de mais uma grande sacanagem capitalista e a gente não percebe ou mal se dá conta dela, e vai engolindo, e sofrendo faltas graves que o "juiz" finge não ver.
É que em plena pandemia, com os estádios de futebol fechados a meses, os "detentores" dos "direitos" sobre os jogos, como da Copa Libertadores da América, só estão permitindo as transmissões ao vivo via TV por pay-per-view, e não por TV aberta.
Ou seja, o torcedor não pode nem ir ao estádio e ainda tem que pagar pra ver!!!
Não seria o caso de os governos e as corporações controladoras darem, esportiva e humanitariamente, um "auxílio emergencial desportivo" e liberarem geral o futebol via TV aberta pra todo mundo?!
Seria uma grande e sábia decisão que contribuiria demais para a alegria, felicidade e saúde mental da população em isolamento social, principalmente a brasileira (e com certeza os anunciantes e patrocinadores também ganhariam, inclusive $$$, muito)!
(foto obtida no Facebook)
já morri tantas vezes
que nem sei
já nasci tantas outras
que rezei
já vivi outras tantas
que errei
em nenhuma acertei
(foto by brumbe: a vela de uma delas)
solidão?
não me assusta a solidão
eu não tenho medo da solidão
até gosto de um pouco de solidão
só não gosto de muita solidão
não tenho medo de solidão
só fico triste com solidão
só com solidão
eu respeito profundamente a minha solidão
foto by Brumbe:
um solitário anjinho
na minha sala de estar sozinho
saudade demais disso:
ir pra praia, ver o mar,
andar na rua, viajar,
sair pelo mundo
pro que der e vier,
ver muita gente, viver...
(foto, da série Minhas Janelas pelo Mundo: minha janela em Caraíva - BA, em 04/3/15)
cidades mineiras II
ah, como tenho saudades,
e desejos e vontades,
de revisitar as minhas cidades mineiras!
mas, como fazer isso sem uma boa companhia,
uma boa companheira?
porque cidade mineira requer fundamentalmente isso,
é lei, é suprema guia:
só se vai em boa companhia!
é bem diferente de ir pra praia, pro mar,
pra'onde bem se vai
só pra caminhar, marear e banhar
cidade mineira é pra namorar e amar
ir pra cidade mineira é diferente,
(além do café e do pão de queijo)
só se chega bem,
se vai mais alguém com a gente
é o jeito mineiro,
ou, o queijo mineiro,
como, queiram...
(foto obtida no Facebook: Tiradentes)
é incrível como uma boa caminhada à beira do mar faz bem pro corpo, pra mente, pra alma, pro espírito! faz bem pra tudo! principalmente pra mineiro, e mais ainda pra mineiro que já morou no litoral e teve que voltar pras montanhas.
é de se entregar e se perder em toda essa imensidão de águas, esse interminável areal, todo esse sol fabuloso, esse onírico e inebriante céu profundamente azul!
e essa fantástica e divina sensação de liberdade e de expansão física, corporal e espiritual?! sei que muita gente já falou e escreveu sobre isso, mas eu tenho cá comigo a minha teoria sobre isso (me desculpem os pleonasmos, mas são propositais mesmo! é uma insana tentativa de reforçar as idéias):
a fascinação do ser humano pelo mar, pelas imensas águas, deve-se simplesmente ao fato de ele ter sido criado, ter sido gerado, lá, nas águas dos oceanos!
é uma irresistível e magnética atração por nossa real origem mais remota, primordial, que está solidamente plantada, enraizada, nas nossas memórias mais profundas.
aliás, essa foi a origem comum de todos os seres animais da Terra. o homem, antes de ser homem, já foi ameba, água-viva, girino, sapo e macaco (e, provavelmente, foi quando era sapo que êle resolveu pular pra fora dágua, e deu no que deu, senão poderíamos ter nos tornado belos tubarões, golfinhos ou baleias).
e fico aqui pensando como um mar e uma praia podem ser tão admiravelmente maravilhosos e inacreditável e contraditoriamente complexos e simples, ao mesmo tempo! por isso alguém já disse também, e eu concordo plenamente, que “the simple is the really beautiful” (o simples é o realmente belo) e vice-versa.
eu poderia ter caído morto ali, naquela hora, nas areias ou nas águas da Bahia, em Arempebe, Arraial, Jauá ou Itamaracá, e estaria tudo perfeitamente bem; a minha atual vida neste planeta estaria terminando de forma plena, satisfatória, gloriosa, sublime e pacífica no próprio final, na própria morte!
(*) uma eterna lembrança dos mares e das praias da minha vida!
(no Facebook em 24/01/2019)
descaminhos em dez caminhos
um menino,
sabe-se d'onde?
sabe-se lá...
nos caminhos do bel'orizonte
de beagá
desceu bem no meio na floresta e não podia ter escolhido lugar mais apropriado pra nascer, crescer e começar a caminhar, porque o negócio dele era só esse mesmo: caminhar, se possível só no mato, na selva, nas imensidões sem fim. era só andar, andar, viajar, se transportar, mudar de lugar. mas, nada de carro, ônibus ou avião. era a pé, passo a passo, no dedão, talvez trem ou caminhão. começou timidamente por ali mesmo, descendo silva jardim, virando Itajubá e contornando pela contorno, mas só semi contornando, do viaduto floresta à floresta adentro até às alturas da boca do lobo, ops, digo, aquiles lobo, pois o contorno inteiro ficaria pra depois, quando pudesse ganhar a cidade inteira.
um pouco mais grandinho se aventurou por novos e mais longos caminhos. desceu toda a silva jardim, virou à esquerda na sapucaí, atravessou o outro viaduto, o santa tereza, e chegou no parque municipal. ah, o parque! uma floresta de verdade tão perto da sua floresta já então tão desflorestada. no meio desse caminho novo é que reparou direito na estranheza, e beleza, daquela rua de um lado só, a sapucaí: do lado de cá, as casas e os prédios, do lado de lá, só a grande murada, o vazio, o nada. só mais abaixo e adiante as linhas do trem (ah, o trem!) e o centrão da cidade.
e muitas vezes ficava ali, naquela rua de um lado só, só olhando lá pra baixo admirando as linhas dos trens das redes estadual e federal, imaginando e especulando até onde elas iriam: rio, são paulo, brasília, rio grande, bahia? e sonhando com o trem que nunca tomaria, o que só iria e não voltaria.
só anos depois, ao atravessar os longos caminhos que o levaram ao mar, e lá conhecer outras ruas de um lado só, as beira-mar, é que viria a entender a sua sapucaí: era uma rua esperando o mar! o mar um dia estaria ali, na sua cidade, às margens daquela rua, e a sua floresta ganharia uma linda praia bem ao longo daquela amurada!
(é verdade que todo o resto da cidade ficaria submerso, inundado, debaixo d'água. mas isso não importava, o importante é que a sua interiorana cidade teria mar e praia!)
e logo, logo, caiu ali mesmo na cidade submersa, quando, ainda menino, começou a trabalhar na loja do pai. descia novamente, diariamente, a silva jardim, virava sapucaí, agora à direita, cruzava o viaduto da floresta, saía na praça do leão, a mesma da estação e naufragava na avenida do pai da aviação, a santos dumont. a lojinha do pai era um armarinho. ar marinho! sempre soubera que o destino dessa terra era virar mar!
e, depois dos grupos escolares, os dos barões perto de casa, mirou rumo aos novos e grandes caminhos estudantis e escolares, todos ao longo da grande avenida, aquela que leva o nome do grande estado brasileiro, a amazonas: começando na escola técnica e terminando no instituto politécnico, com breve passagem, no meio, pelo liceu dos padres de sales. eram 7, 12, 14 quilômetros de bons caminhos de andarilhar bem devagar, quando a tarde mal começava e a noite ainda tardava. eram, frequentemente, às vezes, quase 20 km de ida e volta, longo caminho da floresta à gameleira, cortando o centro, sto agostinho, prado, calafate, barro preto, barroca e nova suíça.
bem nos fins, e ao longo, desse caminho, chegou também a vez dos loucos, insanos e revoltosos comícios-relâmpago, passeatas, piquetes e correrias, com os colegas das medicinas, dos direitos e das engenharias, debaixo de muita cavalaria, coturnos, cassetetes e bombas de gás lacrimogêneo, loucura que, para ele, só acabou, ou foi acabada, no ano que nunca terminou.
chegou, enfim, ainda adolescente, às lindas, misteriosas, instigantes, intelectuais, inteligentes, às vezes luminosas, às vezes sombrias, trilhas dos cinemas. na verdade, teatros e cinemas (todos de rua!), a maioria nas ruas do povos indígenas: acaiaca, tupis, tamoios, guarani, pathé, palladium, metrópole, odeon, floresta, santa tereza, francisco nunes, marília, imprensa oficial, palácio das artes e outros. era o tempo fabuloso, maravilhoso, a era dos sonhos, dos mundos superiores, eternos e infinitos de godard, glauber, fellini, mazzaropi e pasolini.
no embalo das trilhas musicais, teatrais e cinematográficas, logo vieram as trilhas festivas e amorosas do pré/pseudo ébrio-notívago. um menino solidário, errante, e talvez errado, mas nunca perdido, pelas madrugadas da cidade. já eram as horas noturnas dos encontros, namoricos e festinhas pela cidade afora. principal, e literalmente, nos famosos caminhos que o levavam a "subir bahia(rua) e descer floresta" ou vice-versa, velho caminho dos poetas, seresteiros e arruaceiros da cidade. e, também, nas tortuosas ruas, principalmente a do ouro, que subiam a serra, em busca das lindas meninas douradas que moravam nas montanhas.
só na vida profissional, no trabalho ao longo de quase 40 anos, parece ter tomado caminho certo e, literalmente, reto! pois começou bem na avenida central principal da cidade, a afonso pena, desde lá de baixo e seguindo subindo-a quase toda, desde a guajajaras, passando pela contorno, até chegar nas alturas da trifana. sempre subindo a avenida como quem quer subir na vida, coisa que dificilmente pode-se dizer que conseguiu.
por fim, tomou o rumo dos grandes caminhos do norte, aqueles que o levariam a si perder nos confins da terra. floresta, sagrada família, cidade nova, sempre rumo norte até parar em outra cidade, a das lagoas santas. mas, frequentemente reversa pelo caminho contrário, para o sul, para reencontrar os seus amados e inesquecíveis caminhos nativos.
(este mini conto-crônica foi escrito em dez/20 para o concurso literário 2021 da prefeitura de BH, mas não foi inscrito. ocorre que ele tem apenas 8 páginas, e o regulamento do concurso exige, no mínimo, 50 páginas! não consigo escrever um conto ou crônica desse tamanho ou as minhas memórias são muito curtas para tanto. rsrsrs)
(foto de Kellen Guimarães, obtida no facebook: o centrão de BH, visto da rua Sapucaí quase na esquina da minha rua, a Silva Jardim, no bairro Floresta)