Interlagos, Bahia.
Lugar
geográfico: 12º48’20’’S,
38º12’31’’W. Lugar geométrico de rotas solares e caminhos lunares, lugar comum
de alta incidência de luz natural, altos índices de luminosidade solar e
iluminação humana – também natural, orgânica, física, astral, espiritual –, abençoado com
muita água, muito ar, muito vento, muito mar, muita brisa marítima.
Lugar
incomum de vários janeiros, muitos verões, passados, presentes e futuros.
Quatro recentes, consecutivos: dez, onze, doze, treze.
Lugar
de horizontes planos, planificados, que, além da praia e do mar, oferece
nascentes e poentes, seja de sol, seja de lua, exatamente simultâneos, em
horizonte opostos, é claro – nascentes e poentes pra se assistir e curtir por,
no mínimo, 24 horas ininterruptas: um sol nascente, um sol poente e uma lua
nascente, a mesma lua poente, e o mesmo sol novamente nascente, e tudo isso num céu absolutamente limpo, luminescente.
Nos
caminhos pras praias – oitocentos passos, quatrocentos metros –, Rua das
Palmeiras, Clube, Rua da Cascata, Beco do Catarino, pisando nas calçadas de pedras
quentes das dez às dezessete, antigamente gostava de ir descalço mesmo, agora
só de sandálias, senão queima os pés. Aumento do aquecimento global ou da
sensibilidade pessoal?
O
paredão do casarão vermelho-alaranjado, alvo-referencial, de Arembepe cada vez
mais perto e com cada vez mais areia pra vencer. Antes eram 6km de praia, agora
parecem 8! Aumento do nível dos mares, inundação oceânica, esticando praias, ou
simplesmente aumento do meu cansaço?
As
longas e cotidianas caminhadas de guarita-a-guarita, sempre o mesmo caminho
sempre diferente – areias, águas e marés sempre diferentes –, com pessoas
sempre diferentes na praia quase sempre deserta.
Pisando
na areia, nas suas partes mais firmes, finas e aveludadas, os pés sentindo
quase o mesmo que as mãos sentem quando tocam os corpos das mulheres amadas.
Os
canais e os lagos entre terras, os Interlagos, em níveis mais baixos que os
normais. As areias branco-amareladas, ou amarelo-esbranquiçadas, são as mesmas,
ladeando os caminhos e as trilhas. Ciclovias, vias de gente, caminhos pra onde?
Parecem caminhos que percorri muito em outras terras. Em Brasília, no Rio? Não
sei, mas há algo de muito semelhante nestes caminhos.
Uma
ilhota abandonada no meio do canal quase seco e uma ponte quebrada que dava
acesso à ilhota, constantemente me lembram duas músicas: a do “como é que faz
pra chegar na ilha? pela ponte, pela ponte” do Lenine, e a do “vou tomar banho
de canal quando a maré encher” do Chico Science.
O
vento, a brisa, constantes, ininterruptos, refrescantes, lembrando os lugares
onde isso é raro ou não há, justamente porque quando isso há lá, me faz lembrar
de cá, e de desejar aqui estar.
Centenas
de fitinhas de papel prateado dependuradas nas travessas transversais do grande
toldo recém-instalado ao lado da piscina. Fitinhas constantemente tremulando e
cintilando ao vento e ao sol. Memórias dos vários reveions, inclusive o do
milênio, mas não desse último, que aqui não passei. Mas, as fitinhas de papel
prateado cintilante lá estão como que acenando pra mim, murmurando, falando, de
todas as pessoas que estiveram ali, comemorando o ano-novo debaixo desse
festivo grande toldo de lona branca também prateada. Lugar também muito bom pra
se deitar numa espreguiçadeira depois do almoço: essas fitinhas brilhando e balançando
são um sonífero perfeito.
Crianças
brincando no pula-pula, pulando tanto que o último pulo, na cama, certamente não
é percebido, não é sentido, pois já caem adormecidas.
Sentado
no quiosque da churrasqueira, bebendo uma piriguete ou um wiskinho com gelo de
água de coco, ouvindo Gal, Tim e Vercilo,
Festança
pra comer caranguejo, pra quem está acostumado a comer só queijo; queijo
passaporte para entrada de mineiro na Bahia, em contraposição ao camarão que é
o passaporte deles pra entrar em Minas.
A
filha que voltou muito cedo pra BH, e muita saudade deixou por cá. Filhos
costumam muito fazer isso: te levam pra um lugar e depois vão embora mais cedo,
deixando a gente, literalmente, na saudade. Problema ou culpa deles? Não! É o
trabalho que chama. Fazer o que?
E
uns danados de uns urubus que fizeram ninho em cima da lage da caixa dágua e
quebraram a antena de tv broadcasting! Pois é, esses urubus ficam por aí
espalhando largamente as suas asas, do canal para a casa e da casa para o canal,
e a gente sem poder ver nenhum canal porque os urubus quebraram a antena de tv
broadcasting.
Um
calor total – ah, se não fosse essa brisa constante! –, uma moleza no corpo, um
torpor paralisante, um caminhar devagar, quase parando, fazem entender a – e
dar razão à – boa preguiça do povo dessas terras. Simplesmente não dá pra fazer
nada com pressa por aqui!
Entendendo
também o verdadeiro espírito e propósito das “lavagens de rua”: não é a rua que
se lava, mas, sim, as próprias pessoas que passam pela rua, à frente e atrás do
trio-elétrico. Lava-se por dentro, com muita cerveja, e por fora, com muita
água mesmo.
Amália
a dona da casa, Melissa, Gerson, Beatriz, Enzo, Sofia, Túlio, Manuela, Karine,
Lúcia, Dulce, Roberto, Ana Cecília, Mara Mércia, Bruno, Mirela, Maria, Paulo,
Heloísa, Bruninho, Priscila, Luis Roberto, Ricardo, Fernanda, Taiana, Fábio,
Miguel, Luciano, e quem mais veio, e quem mais virá.
Hora
de ir embora, segunda-feira, 9 da manhã, casa vazia, só eu, condomínio deserto,
nem eu, praia absolutamente sem ninguém, olhando pros dois lados, norte e sul,
até onde a vista alcança, ninguém, nem na areia nem na água. Só eu, eu só. Vamos
embora, que é hora.
E
no final, na saideira, um brinde muito especial! Muito mais que um brinde: uma
saudação, uma louvação e uma gratidão ao meu grande amigo e concunhado Milton –
que hoje caminha em praias superiores, pisa em areias multicores –, o cara que
construiu esse pedaço de paraíso pra gente. Salve, Miltão!
Até
2014! Até o consecutivo quinto janeiro, que pode ser no cinco fevereiro!